domingo, 31 de julho de 2016

sexta-feira, 29 de julho de 2016

AMANHÃ, NAS BANCAS, MAIS UMA GRANDE ENTREVISTA NO NOTÍCIAS DE ESPOSENDE COM ALEXANDRE AREIA



Amanhã, nas bancas, mais uma Grande Entrevista no «Notícias de Esposende» com o jovem esposendense, Alexandre Areia, campeão de karting.
A NÃO PERDER.
“…Para já ainda só competi em Portugal e Espanha, este ano ainda penso ir fazer uma prova a Itália…
…A vitória mais importante que tive ate hoje foi sem dúvida para o Campeonato Nacional de Karting, disputada no Kartódromo Internacional de Portimão, na categoria X30 Super, na qual sou rookie, e venci perante grandes pilotos em condições muito difíceis…
…A minha carreira ainda é bastante curta, comecei a apenas 2 anos a competir, mas já conquistei: uma Taça dos campeões, um segundo lugar na Taça Bridgestone, um quarto lugar no Campeonato Nacional na categoria Júnior e um quarto lugar também no troféu Rotax…
…Vou-me esforçar ao máximo com os estudos para poder continuar a competir. Os estudos estão sempre em primeiro lugar…
…O meu sonho é ser piloto profissional…
…Gostaria que todos os jovens procurassem praticar um desporto porque faz bem e os desvia dos maus caminhos como a droga…
… Gosto muito de Esposende e tenho orgulho em ser Esposendense, e quero levar o nome de Esposende o mais longe possível…
...Gosto muito deste jornal pois leva a muita gente o que de bom se faz no concelho, desejo que no futuro tenha muita mais tiragem para chegar a muitas mais pessoas…”

NOTA FINAL
Aqui fica mais uma entrevista a um jovem esposendense que tem levado o nome de Esposende por todo o país e além-fronteiras e que ainda tem muitos títulos para conquistar. Um jovem que tenta conciliar os estudos com a prática de provas automobilísticas e que ambiciona chegar longe. Uma coisa é já certa. Estamos perante um campeão. Um jovem que já tomou o gosto às vitórias e que se habituou a vencer, mas que sabe que para isso é necessário muito esforço, muita prática e muita resistência. O Alexandre Areia parece preparado para ir ultrapassando os constrangimentos próprios da modalidade e cumprir com o seu sonho, que passa pela obtenção de muitas vitórias e por vir a ser um piloto profissional. 
Aproveito para desejar ao jovem Alexandre Areia boa sorte para as suas provas e para os seus estudos. Espero que consiga conciliar os estudos com esta paixão pelos carros e que vá somando os títulos que ambiciona.
Esposende evidencia-se cada vez mais como uma terra de campeões. Temos inúmeros atletas profissionais em muitas áreas, que vão do desporto às mais variadas artes. Da canoagem ao motociclismo, passando pelo futebol, pelo karting, pela música, pela escrita, pelo jornalismo, pela pintura, pela representação, pela medicina, pela escultura, pela arquitetura e por muitas outras artes e ofícios.
Um abraço,
Mário Fernandes


EXPOSIÇÃO DE TRABALHOS DO CURSO DE FÉRIAS DO CENTRO SOCIAL DE CURVOS


Estão todos convidados.

MF


quarta-feira, 27 de julho de 2016

AFINAL FICAMO-NOS PELO PUXÃO DE ORELHAS



Todos vão cantar vitória; O Marcelo, o Costa, a Catarina e o Jerónimo e todos os demais, que como eu achavam as sanções um autêntico disparate. Se já outros 24 Estados tinham incumprido, porque é que havíamos de ser nós os primeiros a pagar a conta.

Acho que a ameaça do Costa funcionou bem. Para fora, porque ia deixá-los às voltas com a justiça e para dentro ao dar voz aos seus parceiros da esquerda.

Agora, vamos ver quais são as medidas que Costa & Companhia vão apresentar lá fora, para os calar, para fazer cá dentro... sem contestação.

MF


SANÇÕES DE MILHÕES!



Não será que as previsíveis sanções a Portugal, que afinal poderão já não ser de valor zero, mas de 18 milhões, em vez de resolver seja o que for, não vão agravar e muito a situação portuguesa?
Bem, mas afinal o que é que a UE pretende?
Se temos um Estado (ou dois, com a Espanha a acompanhar) em dificuldades, apesar da brutal austeridade imposta aos cidadãos (pela troika, por culpa dos nossos desgovernos, é certo) e ainda o vamos castigar com multas e retenção dos fundos estruturais (os tais que deverão servir precisamente para ajudar os mais necessitados), não estarão estes senhores a agravar ainda mais a nossa situação..? Pois, não cumprimos e défice e somos penalizados, não será que para o próximo ano vai ser ainda muito pior? E no passado, quando a própria Alemanha e vários outros incumpriram, porque é que nada aconteceu?
*Nada percebo de política, nem sequer estou a tentar defender o atual ou o anterior governo. São apenas generalidades e constatações.

Isto faz-me lembrar as últimas declarações do senhor Schauble, que mais parece uma ajudinha aos bancos alemães, que indo buscar ao BCE dinheirinho a custo zero, depois o emprestam a 3, 4, 5 e mais %, a países como Portugal.
Será esta a UE que os europeus desejam? Não virão por aí mais uns quantos referendos, para outras tantas saídas?
A solidariedade europeia já era, porque falam mais alto os senhores do dinheiro, os mercados e os fundos sem… fundo e sem rosto!
Mas afinal que UE é esta, que ameaça, chantageia, pune e humilha uma nação?
E a troika? A tal que cá esteve e ditou as nossas políticas? Esses ninguém os responsabiliza por nada?

MF


segunda-feira, 25 de julho de 2016

WORKSHOP SOBRE ESCRITA NO CENTRO SOCIAL DE CURVOS




WORKSHOP SOBRE ESCRITA NO CENTRO SOCIAL DE CURVOS
A convite do Centro Social de Curvos, realizei nas suas instalações um workshop sobre escrita. Os destinatários foram os utentes do 2º e 3º Ciclos do Curso de Férias.
Falamos da importância da escrita e da leitura. De livros e dos meios de comunicação social. As meninas e os meninos, cerca de três dezenas mostraram-se muito interessados e interventivos. Um dos momentos altos foi quando os meninos foram convidados a redigir notícias. Constituíram-se grupos de trabalho, verdadeiras redações, onde foram redigidas notícias a falar das mais recentes atividades da instituição, respeitantes a este Curso de Férias. O passeio ao Algarve, a visita aos Bombeiros Voluntários de Esposende, o workshop de desenho, o torneio de futebol em Apúlia, onde foram campeões, a ida à Galaicofolia, a praia, a culinária, as artes e ofícios tradicionais, a Gala de final de ano levada ao Auditório Municipal de Esposende, o arraial minhoto e as marchas populares de entre várias outros eventos e atividades. Notícias certamente a publicar no jornalinho do Centro, o “CentroInForma”.
Foram momentos muito agradáveis e de uma enorme riqueza. Parabéns aos pequenos jornalistas e às suas responsáveis. A diretora, Elsa Gonçalves Fernandess e a educadora, Andreia Igreja, ambas presentes nesta atividade.
MF







domingo, 24 de julho de 2016

JONINHAS VILAR CONQUISTA MAIS UM TÍTULO DE... CAMPEÃO!



JONINHAS VILAR CAMPEÃO DO I OPEN DE KARATE HCM

Decorreu no sábado, 23 de julho, no Pavilhão Municipal da Mealhada, o I OPEN DE KARATE HCM. A prova, muito bem organizada pela secção de karaté do Hóquei Clube da Mealhada, contou com o apoio da FNK-P Federação Nacional de Karaté e teve como responsável máximo da arbitragem, o Sensei Joaquim Fernandes, Presidente do Conselho de Arbitragem da FNK-P. O atleta da BUSHIDO AK, Joninhas Vilar, cadete -52 kg, voltou a sagrar-se campeão em mais um torneio de karaté, desta vez num open de cadetes, completando assim, uma época desportiva bastante interessante, pois durante a presente época, venceu em -52 kg, -57kg, -60kg, -63kg e agora, num open com atletas de diversos pesos, dentro do escalão de cadetes.

Paabéns, amigo Joninhas. Segue em frente com toda essa força e querer. Um dia ainda vais ser... Comendador!

MF


sábado, 23 de julho de 2016

À CONVERSA COM CRISTINA LEITES, CEGA DE NASCENÇA, LICENCIADA, TELEFONISTA DA CÂMARA MUNICIPAL DE ESPOSENDE



CRISTINA LEITES É CEGA DE NASCENÇA, MAS LICENCIOU-SE EM FILOSOFIA E JÁ DEU AULAS. HOJE, É A TELEFONISTA DA CÂMARA MUNICIPAL DE ESPOSENDE

Cristina Leites nasceu no dia 25 do mês de Maio no ano de 1969, na Vila de Fão onde sempre residiu. Já deu aulas, mas é desde 2001 a telefonista da Câmara Municipal de Esposende. Vamos falar um pouco da Cristina, dos seus gostos e preferências e do seu percurso pessoal e profissional.

O que é que gosta mais de fazer. O que é que lhe dá mais prazer fazer?
Gosto de ir à praia a partir das sete da tarde, hora em que começa a ficar vazia. Caminho sem apoio da pessoa que me acompanha, não há atropelamentos, e tenho todo o tempo necessário para sentir a areia fina sob os meus pés. Gosto de ouvir as ondas do mar, de as sentir, de brincar com elas, apesar de a água ser demasiado fria.
Há outra coisa que gosto de fazer, que me dá mesmo prazer fazer logo de manhã: observar, refletir sobre o que me rodeia. Chego ao meu local de trabalho dez minutos antes das oito, e como entro ao serviço às 8:30, costumo sentar-me no banco do jardim quando não está molhado. Sinto as flores, o seu perfume, a sua cor, o cheiro da terra, a brisa fresca… Ouço os pássaros, a sua “conversa” incompreendida por mim, porém, aliciante. O meu ouvido, sempre atento, acompanha o sobrevoar dos pássaros em círculo, e “vê” o líder, à frente, a dar as indicações aos demais, que o acompanham, sempre a comunicarem uns com os outros. Tento adivinhar do que falam, porque sobrevoam em círculo sempre naquela área, o que estarão a procurar, para onde pretendem ir, até que, por fim, desisto de os entender, e sorrio pelo simples facto de ter o privilégio de estar ali a vivenciar aquele espetáculo extraordinário. E então penso em mim, em tudo o que passei para me tornar naquilo que sou hoje - em como sou feliz pelo facto de existir, de ser autónoma como vocês, e mesmo como os pássaros… Essa minha observação matinal antes de entrar no meu local de trabalho faz-me sentir bem comigo mesma, com vontade de seguir em frente, sem pensar em desistir do que quer que seja.

Como é que costuma ocupar os seus tempos livres?
Preencho os tempos livres a ler um bom livro, a ouvir música, a fazer pesquisas na Internet, a comunicar via skype com os meus amigos… Relativamente à televisão, apenas assisto ao Jornal da Noite da SIC e pouco mais, porque não gosto dos programas que passam. Tenho muita sorte em estar empregada, caso contrário morreria de tédio com os programas televisivos que as estações costumam transmitir.

E hobbys. Quais são os seus hobbys?
Faço caminhadas diariamente, cerca de mais ou menos quatro quilómetros. Adquiri dois equipamentos de ginástica, por isso, às vezes costumo terminar a atividade física em casa: bicicleta e step. Além disso gosto de assistir a alguns concertos, a peças de teatro, visitar museus…

Temos agora que falar na sua doença. É de nascença ou já alguma vez viu?
Nasci cega total, e segundo o meu oftalmologista, o nome da minha cegueira é denominada de hipoplasia nervosa dos nervos ópticos. A hipoplasia do nervo óptico é uma alteração congénita na qual o nervo óptico está subdesenvolvido (pequeno) e caracterizado por um número reduzido de axónios. Olhando para os meus olhos não dá para notar que sou cega, visto ser um problema relacionado com o cérebro. Porém, esse problema não afetou a minha área cognitiva, pelo que consigo fazer a minha vida normalmente: sou uma pessoa capaz, apta a gerir a minha vida, formei-me, trabalho, moro sozinha, sendo todas as atividades diárias desempenhadas por mim.

E a medicina ainda não lhe conseguiu dar uma resposta?
Não, para já não há boas notícias. Não há possibilidade de uma cirurgia, pelo menos por enquanto, na medida em que mexe com o cérebro, e neste momento seria fatal…

Mas continua esperançada, não é verdade?
Sim, com o avanço da medicina, acredito que um dia também vá conseguir enxergar tudo o que me rodeia com os próprios olhos. Mas tenho receio de me desiludir, porque vejo as coisas de maneira diferente, e por muito que me tentem explicar certas coisas, imagino-as de acordo com as minhas sensações. Mesmo assim gostaria imenso de ver, porque um dos meus sonhos é conduzir um carro, algo que dá muita autonomia a quem vê.

Cristina, como referiu que via as coisas de uma maneira diferente de nós, não nos quer explicar melhor como vê as cores, os animais, algumas paisagens terrestres, e as… pessoas?
Apesar de ser cega dou muito valor às cores. Interpreto-as, tendo em conta alguns aspetos sensitivos que considero cruciais para cada uma delas. Deste modo, não sou assim tão diferente de vocês, porque também as aprecio, apesar de não as ver com os olhos. Poderia falar em todas, porém, vou exemplificar as que considero mais relevantes:
Azul-turquesa - esta é a minha cor preferida, porque me transmite uma frescura agradável. Quando estou vestida com peças de vestuário dessa cor sinto-me rejuvenescida, envolvida por uma luz poderosa, repleta de energias positivas para continuar a seguir o meu caminho, e luto com todas as forças pelo que acredito;
Branco – esta cor transmite-me uma paz interior, sinto-me tão bem, que recorro a ela com muita frequência no Verão.
Quando estou a comer um ovo estrelado associo-a à sua clara, fico a prendê-la entre os dentes, no sentido de a sentir através do paladar… Considero-a frágil.
Também a associo ao algodão doce, tanto no paladar como no toque, porque quando o como, arranco pequenos pedacinhos do pau que o suporta;
Pérola – É uma cor suave que me deixa tranquila. Quando contacto com esta cor, sou mais paciente no que respeita a resoluções de assuntos que me irritam;
Amarelo – Associo esta cor aos canários, aos patinhos recém-nascidos, à gema do ovo, ao sol… Adoro os patinhos acabados de nascer. São tão fofos, sensíveis ao toque, frágeis, macios, cheiinhos… Quando estou em contacto com o amarelo, penso muito neles.
Também associo a cor ao sol, devido à pilha de calor que ele nos transmite;
Verde – o cheirinho da relva acabada de cortar faz-me lembrar logo essa cor. Quando como um fiz de limão também a sinto presente;
Vermelho – não gosto da cor, não tenho peças de vestuário dessa cor, e nem quero! Toda a gente (ou a maioria das pessoas) associa essa cor ao coração, à paixão, ao amor, mas eu não. Para mim, a cor da paixão tanto pode ser o verde (na medida em que tenho esperança de um dia me apaixonar), ou então o azul-turquesa. A cor vermelha deixa-me revoltada, frustrada, de mal comigo e com os outros, por esse motivo, não a aprecio. Além disso, quando toco um tecido de cor vermelha sinto-o mais áspero, agressivo, mais um motivo para a rejeitar com todas as forças; é uma cor agressiva que nada me diz.
Quanto à descrição física das pessoas, imagino-as de acordo com o corpo humano. Umas mais gordas do que outras, com rostos mais redondos ou mais compridos, e aí tenho a perceção, visto já ter analisado rostos de colegas da faculdade, devido ao facto de terem insistido comigo, a fim de os ficar a conhecer tal e qual eles são… Também já analisei corpos de alguns familiares, pelo que tenho alguma perceção táctil. Relativamente ao tom de pele é complicado imaginar. Sei que há pessoas de raças distintas, umas mais brancas do que outras, e aí sei que, por muito que tenham a pele muito clara, nunca poderão ter a cor da clara de um ovo estrelado… Porém, não dou muito valor ao aspeto físico, até porque isso para mim não é relevante. O que me encanta nas pessoas é o seu interior. Logo no primeiro contacto que tenho com a pessoa consigo saber se está a ser sincera, se está a gostar de dialogar comigo, se é sensível, se sorri naturalmente ou de uma maneira forçada… Quando uma pessoa se aproxima de mim com muitos sorrisinhos tento analisá-la pormenorizadamente, uma vez que o facto de estar a mostrar muito os seus “belos dentes” pode não ser sinal de boa companhia… Relativamente às paisagens terrestres saliento os jardins, porque são algo que me fascinam. Imagino os jardins limpos, com muita cor, perfumados, com muitas árvores e flores de todos os tamanhos. Nos meus primeiros dois anos de faculdade ia estudar com um grupo de colegas para o jardim botânico, que fica situado no campo alegre, no Porto, uma vez que frequentávamos a que é Agora Faculdade de Direito e Psicologia. Eu adorava aquele cenário todo: as flores, o relvado, as árvores… adorava o jardim… Havia lá alguns lagos com rãs; elas estavam sempre a coaxar, e para mim, toda aquela cena era extraordinária! Imaginava os lagos bem tratados, com uma água transparente, com nenúfares, e “via” as rãs sempre à superfície a embalar-nos enquanto estudávamos…
Um dia comentei isso com um colega, e ele disse que o jardim estava muito maltratado, o lago das rãs estava sujo, cheio de lixo, sem nenúfares… Acreditei nele, mas prefiro imaginar aquele local de maneira diferente, porque sentia uma paz quando lá estava, e não consigo imaginar a paz a “conviver” com aquela cena deprimente…
Quanto aos animais, já toquei nos domésticos, e pouco mais. Porém, há uns bichinhos horríveis em quem nunca consegui tocar: os ratos. Já tive a oportunidade de tocar nesses animaizinhos horrorosos no instituto interno que frequentei durante sete anos, porque estavam embalsamados, mas não consegui. Comecei a gritar, e nenhum adulto se atreveu a forçar-me a tal coisa. Apesar de nunca ter tocado em ratos, sei que têm um pelo macio, um rabo comprido, um focinho com bigodinhos dos lados… Mesmo sabendo disso, imagino um rato com um pelo muito áspero, agressivo, ou então cheio de picos, porque a própria palavra rato faz-me arrepiar da cabeça aos pés…
Aproveito para contar um episódio sobre um bicho em que toquei sem saber o que era. Um dia a minha mãe chamou por mim, e pediu-me para ir ter com ela, para ver uma coisa. Não sei explicar porquê, mas aquele tom de voz dela deixou-me desconfiada, aproximei-me dela, e perguntei-lhe de que coisa se tratava. Ela disse que era um simples bichinho, e enquanto me explicava isso pegou na minha mão, depositou-a sobre um grande bicharoco, que tinha o pelo mais macio, mais fofo de todos os bichos em que já toquei! Retirei a mão bruscamente, comecei aos gritos, e só pronunciava a palavra rato. Ela disse que não era um rato, mas sim uma grande toupeira que tinha acabado de matar… Tentei ganhar coragem para voltar a tocar nela, mas só a palavra toupeira fez-me recuar, e nunca mais pensei no assunto.

A Cristina tem uma página no facebook, onde regularmente publica inúmeras mensagens e onde certamente segue a atualidade local e nacional, até porque costumo vê-la, uma vez que me dá o prazer de ser seu amigo e onde interage com as pessoas de suas relações e com o público em geral. É verdade que as redes sociais vieram facilitar a vossa forma de comunicar? Como é que o cego escreve no computador? Têm um computador diferente do nosso? É adquirido em lojas próprias para cegos?
As redes sociais facilitam a comunicação aos cegos e não só, no sentido em que há uma maior proximidade entre as pessoas. Podemos conversar em privado pelo chat, publicar as nossas informações preferidas, e isto sem as redes sociais não seria possível.
A informática veio revolucionar a vida dos cegos, porque também eles conseguem aceder ao computador, desde que ele tenha uma acessibilidade instalada: o Jaws. O Jaws é um leitor de ecrã que suporta uma voz denominada de eloquense, que transmite aos cegos o que é digitado no Word e não só. Conseguimos aceder à Internet, trabalhar com o skype, ler os jornais, consultar e enviar e-mails, fazer downloads, compras online, aceder ao facebook, instalar os programas, etc. É uma acessibilidade que pode ser instalada em qualquer computador, pelo que posso perfeitamente adquirir um mesmo na Worten, ou em qualquer loja de informática. Não é necessário o teclado estar em Braille. O computador é comum, e tem um teclado comum. Os únicos destaques e que estão presentes em todos os teclados, são umas marquinhas em alto-relevo nas teclas "F" e "J", e no número "5" do teclado numérico, sinais que nos servem de referência. Se eu instalar o Jaws no seu computador, garanto-lhe que consigo entrar em todos os seus ficheiros, inclusivamente ir à Internet, ler jornais, consultar e-mails, ir ao facebook, ao youtube, entre outros sites. O importante aqui é que os sites respeitem a acessibilidade, mas nem sempre isso se verifica. Quanto ao facebook, encontrei lá colegas de Liceu e de Faculdade que não via há anos, e sinto-me feliz por também conseguir dominar toda essa maravilha. Faço sensibilizações sobre a deficiência, não só em Infantários como também em Escolas Primárias, Preparatórias, Liceus, Escolas Profissionais e até em Faculdades, e todas as fotografias são publicadas por mim na minha página. O meu sintetizador de voz (o Jaws) não as descreve. Quando as Escolas me enviam as fotografias das sensibilizações por e-mail, depois de fazer o download atribuo-lhes um número, para me conseguir organizar. Seguidamente envio-as a uma amiga que também trabalha na Câmara, pergunto o que estamos a fazer em cada uma delas, se estão bem tiradas, e ela descreve por escrito cada uma ao pormenor. Eu sei perfeitamente o que faço nas sensibilizações, porque são preparadas por mim dias antes de ir às Escolas. Porém, gosto de saber o que está representado em cada fotografia, até porque em algumas delas costumo colocar uma legenda, no sentido de elucidar melhor as pessoas que as observam. Depois de ler as respostas dadas pela minha amiga, seleciono as que ela me aconselha, preparo um texto alusivo ao que foi feito, e publico-o, juntamente com elas. Sem o facebook não teria a possibilidade de dar a conhecer as minhas sensibilizações, e desde que publiquei os meus trabalhos têm-me convidado mais para ir a escolas, mesmo fora do nosso concelho. Além das redes sociais, a Internet facilita o cego no que respeita a pesquisas, e ajuda-nos a viajar pelo mundo. Também faço compras online na página do continente há algum tempo, e não me consigo imaginar dependente dos outros nessa função. Dá-nos mais autonomia, e isso é extraordinário!

Já deu a entender que mora sozinha… Não nos quer explicar algumas tarefas que desempenha em casa?
As tarefas domésticas são todas realizadas por mim, e para tal, tenho de recorrer aos outros sentidos: tato, olfato, audição, e mesmo ao paladar quando estou a cozinhar. Como não sou dotada de visão tenho de ser rigorosa, metódica, para que as tarefas saiam bem. No momento em que descasco uma batata coloco em prática o tato. Os dedos procuram a casca, a faca segue-os, e a batata é descascada cuidadosamente, para evitar o corte na pele.
O cego em contacto com o fogo é algo que assusta muito as pessoas “ditas normais», mas acredite que é possível colocar a panela sobre o bico do fogão sem me queimar. O meu fogão é analógico. Depois de rodar o botãozinho correspondente ao bico que quero ligar, ouço o gás a sair, aproximo o isqueiro dele, e ligo normalmente. Está ligado, reduzo a chama para não sentir muito calor nas mãos, tento estabilizar a panela sobre ele, com cuidado. Quando me apercebo que ela está em segurança, a chama do fogão poderá ser colocada no máximo. Sei quando a comida está pronta pelo olfato, também a provo, e mesmo quando a toco com a colher. O cego tem de ser metódico na cozinha, para se conseguir organizar. Por isso, enquanto a comida está a ser confecionada costumo lavar a louça que sujei, limpar as bancadas, e verificar se alguma coisa se encontra em desalinho.
Prefiro utilizar o aspirador para limpar a casa, na medida em que não levanta tanto pó, e não tenho muito jeito para varrer; apenas varro o passeio da rua junto à minha casa. Passo o aspirador, e apercebo-me que o chão está limpo pelo som que ele emite, porém, caso tenha alguma dúvida, posso sempre recorrer ao tacto…
O ferro de engomar pode ser perigoso. Por isso, ligo-o com cuidado, estendo a peça de roupa na tábua e componho-a com as mãos. Em seguida passo o ferro normalmente sobre ela, e à medida que ele avança, afasto a mão esquerda para não me queimar. Demoro mais tempo que vocês, mas o importante é chegar ao fim da tarefa… Depois de engomar, é necessário arrumar as roupas no armário, e há que ter em atenção a conjugação das cores.

Como consegue saber a cor da sua roupa?
Apesar de o cego não ser dotado de visão, é desde cedo confrontado com o problema de escolher o seu próprio vestuário, e para isso temos duas alternativas:
A primeira (e talvez a menos falível) tem a ver com a minha boa memória e também com a ajuda do tato: Quando me dirijo a uma loja examino bem a peça de vestuário antes de a comprar, apercebo-me da sua textura e feitio, e depois de me revelarem a cor, não a posso esquecer. Se por acaso tiver duas peças de roupa com cores diferentes, e com feitio e textura iguais, posso, por exemplo, eliminar a etiqueta de uma delas, ou colocar alguma marquinha no seu interior.
A segunda alternativa é um detetor de cores falante que, em contacto com o objeto, indica a cor que lhe corresponde. Esse aparelho tem o tamanho de um telemóvel, e chama-se colorino. Além de detetar a cor, emite dois sons diferentes:
- Um som agudo, caso a luz se encontre ligada;
- E um som grave, caso se encontre desligada.

A Cristina referiu que fazia as compras online, no continente. O site é acessível?
O site tem sido acessível, exceto no campo notas, que não nos dá autonomia para escolhermos algum produto com modelos diferentes… Já me deparei com essa inacessibilidade, mas envio e-mail à linha de apoio ao cliente, ligam-me, e eles mesmos selecionam o modelo que pretendo adquirir. Relativamente ao resto, não tenho problemas. Estou inscrita há algum tempo, e nunca me arrependi da decisão que tomei. Encontro os produtos, consigo colocá-los no carrinho de compras, seleciono o dia e a hora de entrega, e tem lá algo que me ajuda imenso: as etiquetas em Braille. Ao entrar no nosso perfil encontramos algumas preferências, e podemos selecionar as que consideramos mais convenientes. As etiquetas em Braille estão lá bem visíveis, selecionei-as, e os meus produtos chegam a minha casa todos etiquetados em Braille! Não é extraordinário? Assim consigo identificar alguns produtos, como por exemplo: enlatados, detergentes, sei a marca de cada iogurte e o prazo de validade… Os meus pais e irmãs sempre se disponibilizaram para me ajudarem nas compras, mas prefiro fazê-las online, pelo facto de os produtos me serem entregues com as etiquetas em Braille. Há produtos do dia-a-dia que compro no Jaju, (o pão, a fruta, legumes…) Gosto imenso de ir ao Jaju. As funcionárias são muito simpáticas, e sempre me auxiliaram em tudo. Vão comigo buscar os produtos, ajudam-me imenso, e sinto-me bem quando vou lá.

Atualmente é a telefonista da Câmara Municipal de Esposende. Acha que as pessoas que diariamente atende, ao telefone, imaginam que estão a falar com uma pessoa que não vê nada, que é cega?
Algumas pessoas que ligam para a Câmara diariamente já sabem que sou cega, mas nunca lhes dei essa indicação. As pessoas ligam, falam comigo, atendo-as normalmente, transfiro a ligação, mas há sempre um colega ou outro que acaba por informar que sou cega, talvez em conversa, não sei…

Tem alguma estória para nos contar sobre algum munícipe que considere relevante?
Há algo que acontece de vez em quando, e que me faz descontrair… Alguns munícipes pedem para falar com um certo colega mas não sabem o nome… Sabem apenas que é muito cheiinho, sorridente, de cabelo e olhos com uma determinada cor, etc. Começo a rir, e informo-o que no nosso local de trabalho há tanta gente com esse perfil, que se torna difícil ajudar… Poderia dar a indicação da minha deficiência, porque nunca a tentei esconder; mas resolvo dar a volta ao diálogo e brincar um pouquinho (respeitosamente) com quem liga… Dá-me prazer e não prejudico ninguém… Então o munícipe de tanto pensar acaba por lembrar o nome que estava debaixo da língua, e transfiro a ligação…

E os seus colegas de trabalho são solidários e colaborantes?
No nosso local de trabalho somos todos solidários uns com os outros, e colaboramos sempre em tudo o que é necessário… Nunca tive razão de queixa… Sempre que necessito de alguma coisa ajudam, e eu tento ajudar também dentro do possível.

Apesar desta limitação, estudou, licenciou-se em filosofia e chegou mesmo a dar aulas. O que é que falhou para que continuasse na docência ou foi uma opção sua?
Dei aulas durante alguns anos, sempre com horários incompletos, chamavam-me a meio do ano para cumprir horários de colegas que metiam atestados, e isso não me deixava segura profissionalmente. Além disso nem sempre me chamavam para cumprir horários, e como queria ter casa própria, tive de arranjar um emprego mais estável. Não imagina como me custou abandonar a minha carreira profissional, uma carreira ambicionada, e para a qual lutei durante cinco anos na Faculdade… Mas tenho a certeza que se tivesse ficado na docência, ainda hoje não estaria vinculada. Contacto com colegas que cursaram comigo, andam a saltar de colégio em colégio, sempre com horários incompletos. Vivem com os pais, e mal ganham para a gasolina…

Quer explicar-nos como dava as aulas e como era a sua relação com os alunos?
Quando terminei a Faculdade lecionei durante alguns anos. Foram os melhores anos da minha vida. Lembro-me bem do primeiro dia em que me estreei como professora. Estava nervosa, porque não sabia como os meus alunos iriam receber uma professora cega.
Na aula de apresentação peguei no giz, e comecei a escrever no quadro. Tentei demonstrar que, apesar de ter nascido cega, conhecia o alfabeto utilizado pelas pessoas “ditas normais”. Em seguida perguntei-lhes se gostariam de conhecer o alfabeto em Braille. Responderam afirmativamente, entreguei a cada um deles uma folha com o alfabeto, contendo na parte inferior um pequeno texto filosófico, que eles descodificaram até ao final da aula.
Na segunda aula comecei a introduzir a matéria. Enquanto lecionava, apercebi-me que um aluno tentava sair da sala silenciosamente, pelo que me pronunciei de imediato, pedindo que recolhesse ao seu lugar. Admirados com a minha perceção brincavam comigo, e perguntavam se era mesmo cega. Dei-lhes a entender que me apercebia de tudo o que faziam na sala, e aos poucos, eles chegaram à conclusão que seria inútil tentar enganar-me, na medida em que eu permanecia sempre atenta a qualquer ruído.
As aulas decorriam normalmente. Ditava o Sumário, pedia ao delegado de turma que o transcrevesse para o Livro de Ponto, e ele indicava a linha aonde deveria assinar.
Expunha a matéria, debatíamos temas, sendo, deste modo, quebrada a monotonia. No final pedia a um aluno que fosse ao quadro, dava as instruções para que esquematizasse a matéria, a fim de elucidar o que tinha sido dito durante a aula.
Durante os anos em que lecionei, nunca quis um funcionário na sala a vigiar os alunos. Rejeitei logo essa possibilidade, porque não queria que me vissem como uma docente diferente dos demais.
Como tive aulas de informática no 4º ano da Faculdade, era eu quem elaborava os próprios testes que dava aos alunos no dia determinado.
Depois de elaborar os testes no computador imprimia um exemplar, para deixar ficar na reprografia. No dia do teste, um colega ajudava-me a vigiar os alunos. Os testes eram lidos por alguém de confiança, e eu atribuía as cotações.

Está satisfeita com o que faz atualmente ou gostava de fazer algo diferente? O quê?
Profissionalmente não me sinto realizada. Aliás, é frustrante terminar uma licenciatura, para posteriormente passar os dias a atender, transferir e efetuar ligações… Não desvalorizo a função que desempenho visto ser a imagem da Câmara, mas tenho potencialidades para mais. Gosto imenso de estar no meio dos livros, por isso, trabalhar numa biblioteca tornaria a minha vida mais completa… Ou então trabalhar na área da mobilidade, pois mais do que ninguém sei o que as pessoas portadoras de deficiência necessitam no que respeita a esse assunto.

E a sua família? Conheço o seu pai e sei que sempre a acompanhou com todo o carinho e atenção.
Os meus pais estiveram sempre presentes nos bons e maus momentos da minha vida. Sempre me apoiaram, nunca me trataram como uma inválida, nunca me subestimaram, sempre me deram força para continuar a lutar por tudo em que acredito, e isso faz deles as melhores pessoas do universo… Além de me terem dado sempre carinho e atenção quiseram que eu estudasse, e então surgiu a oportunidade de me internarem num instituto de cegos. Foi doloroso para mim e para eles, mas teve de ser… para o meu bem…

Foi internada muito nova? O que fazia nesse Instituto?
Fui internada No Instituto de S. Manuel (Porto) no dia onze de Outubro de 1976, (segunda-feira), com sete anos de idade.
Nesse Instituto fui confrontada com uma rigidez que desconhecia. Começou logo com a primeira refeição que fiz lá, já com os meus pais bem distantes. Lembro-me de me ter sentado à mesa com alguns colegas, comecei a comer, com o garfo na mão direita e um pedaço de pão na esquerda, porque era assim que fazia em casa. A monitora de serviço aproximou-se de mim, tirou o pão da minha mão, fez com que segurasse o garfo na mão esquerda, a faca na direita, e ajudou-me a comer, em silêncio. Habituei-me a comer com faca e garfo, e quando vim passar o meu primeiro-fim-de-semana a casa, exibi as minhas boas maneiras. Utilizei bem os talheres, e o meu primo, mais novo do que eu dois anos, também quis experimentar. Custou bastante no início, mas vinha passar todos os fins-de-semana com a família. Sabia que me tinham internado a fim de me prepararem para a vida, e à medida que fui crescendo, tomei consciência de que aquela tinha sido a melhor opção. O tempo é muito precioso, sem o qual nada teria sentido. Por isso aprendi a geri-lo, baseando-me na execução de tarefas, que deveria concluir na hora determinada pelos funcionários.
Assim, passávamos as manhãs com a professora primária, e as tardes eram ocupadas com tarefas da vida diária, como: lavar, engomar, costurar, cozinhar, arrumar uma casa, etc. Além disso tínhamos aulas de música e de educação física, e claro, os nossos tempos livres. Brincávamos uns com os outros, fazíamos caminhadas à volta do edifício, jogávamos à corda, às escondidas, andávamos de baloiço, de escorrega, cantávamos em roda, organizávamos festivais da canção, brincávamos às donas de casa, aos médicos…

Como é que as pessoas a olham? Acha que elas dão valor às suas conquistas?
Quando falo com algumas pessoas, sinto que me veem apenas como uma ceguinha. Não levam a sério todo o esforço que faço, e acontece muito com aquelas que têm grau académico. Acham-se superiores a mim, os cursos que tiro não são relevantes, servem apenas para passar o tempo, contrariamente aos delas, que as enriquecem profissionalmente… Os deficientes esforçam-se muito para tirarem um curso, costumam levar o seu estudo a sério, pelo que deveriam ser respeitados também relativamente a isso. Tirei uma licenciatura, mas foi merecida; não comprei o meu canudo, como muita gente deve pensar.
Mas não é tudo mau; há pessoas que me acham corajosa, determinada, acreditam que posso ir mais além, olham-me com admiração, respeitam-me, e isso também me ajuda imenso a batalhar.

Acha que hoje em dia as pessoas ainda precisam de mudar as suas mentalidades relativamente aos cegos, ou na maioria já respeitam e integram?
Seria bom que a maioria das pessoas nos respeitassem, nos integrassem, mas não é verdade. Sem se aperceberem, excluem-nos muito no dia-a-dia. Falam muito em pessoas normais, perfeitas, e em pessoas que não nasceram perfeitas – os deficientes. Não concordo. As pessoas que veem não são normais, mas sim “ditas normais”, porque todos nós temos limitações, umas mais notáveis do que outras.
As pessoas “ditas normais” têm curiosidade em saber como o cego desempenha determinadas funções. Quando encontram um cego acompanhado da família, em vez de se dirigirem a ele, ignoram-no, perguntam a quem vê, e isso nunca se deve fazer. A questão deve ser colocada diretamente ao cego, porque a sua deficiência é apenas visual. Também consideram os cegos todos colegas uns dos outros, e dizem que vivem num mundo à parte… Não concordo. Não vivo num mundo à parte, e os cegos não são todos colegas uns dos outros. Se estivermos perante um grupo de pessoas “ditas normais», todas cheiinhas, de estatura baixa e de nacionalidades diferentes, serão também colegas umas das outras? Porque é que o cego tem de ter colegas espalhados pelo mundo, que para ele são desconhecidos, na medida em que nunca teve contacto com eles, mas que a sociedade insiste em afirmar que são só pelo facto de serem portadores da mesma deficiência?
No meu entender, é necessário lutar a sério contra a exclusão social. Esta luta deverá ser feita diariamente, sempre que se justifique, e a maior parte das vezes isso não acontece. A sociedade lembra-se muito dos deficientes quando se aproximam determinadas datas marcantes, e se os órgãos de Comunicação Social estiverem presentes, melhor! Não tenho nada contra os órgãos de comunicação social. Porém, acho que hoje em dia as pessoas exageram, convidam-nos para tudo, gostam de ser filmadas, fotografadas, falam sobre a nossa deficiência recorrendo a frases feitas, dão calinadas, não utilizam os termos corretamente, apenas querem ficar bem vistas perante o público, e quando o “teatro” termina, cai tudo no esquecimento… Uma luta é muito mais do que isso; é um trabalho árduo que nem qualquer pessoa está disposta a encarar: implica ação, determinação e, sobretudo, corte radical com a hipocrisia e pobreza de espírito. Enquanto as pessoas não mudarem as suas mentalidades, haverá sempre exclusão.

A Câmara de Esposende tem desenvolvido um trabalho que me parece importante ao nível de facilitar a mobilidade, para as pessoas que andam em cadeiras de rodas. E para os cegos, esse trabalho também tem sido positivo, ou seja, têm sido dadas melhores condições?
Os passeios em Esposende não costumam ter buracos, e isso ajuda-me a caminhar sem problemas, na medida em que não caio. Relativamente a Fão há ruas sem passeios, alguns são irregulares, fazem-nos tropeçar, mas acredito que com o tempo isso também passe a ser corrigido, porque sei que a Câmara Municipal é a favor da acessibilidade para todos…

Acha que o cego consegue circular na via pública do nosso concelho sem problemas, ou sente dificuldades? E em relação aos transportes públicos, sente alguma insegurança?
Relativamente à circulação na via pública, existe muita falta de civismo: carros estacionados em frente às paragens, sobre as passadeiras, nos passeios, e agora tente imaginar como é circular em passeios estreitos, que ainda por cima recebem as rodas laterais dos carros… E não adianta ligar à GNR do nosso concelho, porque há dez anos ia sendo colhida por carros devido a veículos mal estacionados. A zona a que me refiro não tem passeios, os veículos estavam lá estacionados, e tive de contorná-los com a bengala, deslocando-me para a estrada. De repente passou um carro em alta velocidade, segurei-me com força ao veículo que tentava contornar, assustada. Como sabia que ali era proibido estacionar Liguei à GNR, identifiquei-me, disse que era cega, isso aconteceu durante algumas vezes, dei sempre conhecimento, e nada fizeram. Um dia falei com uma pessoa conhecida sobre o assunto, essa pessoa entrou em contacto com a GNR, e como dessa vez não foi uma cega a fazer a participação, agiram de imediato…
É complicado circular em algumas ruas do concelho devido a passeios demasiado estreitos, porque a bengala tem de fazer o arco para me proteger, e acabo por bater com ela nas pessoas que passam. Quando fazem obras no sentido de tornarem os passeios mais amplos, os comerciantes aproveitam logo a oportunidade para os ocuparem com mesas, cadeiras, plantas, e isso torna-se constrangedor para mim. Aliás, a época de Verão é um martírio para mim; suspiro sempre pelo seu fim devido à falta de civismo…
Vou muitas vezes ao Jaju, desoriento-me devido aos painéis publicitários que se encontram no passeio, bem como a mesas e cadeiras de um restaurante. Os comerciantes deveriam ser obrigados a colocar os painéis publicitários numa área em que não prejudicasse quem tem limitações. Consigo colocar-me no lugar deles, querem vender mais, mas eles também deveriam colocar-se no meu, porque não sabemos o dia de amanhã. Também deveriam ser obrigados a isolar as esplanadas, de maneira a que o cego conseguisse contorná-las, sem invadir a privacidade de quem está sentado a consumir.
Circulo nos transportes públicos normalmente. Quando chego à paragem, tento contornar o passeio com a bengala a ver se algum carro se encontra estacionado a sua frente, apesar de saber que é estacionamento proibido. Caso esteja, coloco-me ao lado dele, junto à estrada, para que o transporte público me consiga ver. É desagradável, uma vez que os carros circulam mesmo junto a mim, e quem me vê deve pensar que não sei bem aonde estou…
Se não estiver nenhum carro mal estacionado fico na paragem, tranquila. Muitas vezes estou sozinha, quando me apercebo que um transporte se aproxima faço sinal de paragem, e pergunto se passa na minha terra. Depois de entrar, o motorista costuma indicar-me um lugar à frente, e isso ajuda imenso, porque evita o constrangimento de me deslocar à procura de um lugar vazio, tocando com a bengala em quem ocupa o seu. Sei quando chego à minha paragem pelas curvas, pelos próprios sons, mas como os motoristas já me conhecem, costumam parar aonde tenho de sair sem que eu diga nada.

Cristina, qual é o seu sonho?
Tenho tantos sonhos… Viajar pelo mundo, andar de parapente, de balão…
O parapente é algo que me atrai, porque gostava de me desvincular da terra durante uns minutos, e sentir o céu mais perto de mim, de me sentir “pássaro”, de sentir o vento de uma maneira diferente… Não quero partir deste mundo sem experimentar essa maravilha, e tenho esperança de um dia conhecer alguém destemido que alinhe comigo nessa aventura extraordinária. Também gostava de conduzir um carro, mas esse sonho sei que em princípio não irei concretizar…

Quer deixar aqui uma mensagem, ou melhor, duas mensagens. Uma para os cegos e outra à comunidade em geral?
Incentivo todos os cegos a não desistirem dos seus objetivos, dos seus sonhos. Lutem sempre por tudo aquilo em que acreditam, por tudo o que lhes dá prazer, não só a nível pessoal como profissional.
No que respeita à comunidade em geral, vou deixar uma citação que considero elucidativa, e gostaria imenso que a levassem a sério:
"Sendo cega, permito-me dar um conselho àqueles que podem ver. Procurem olhar para todas as coisas, como se fossem ficar cegos amanhã. O mesmo para os cinco sentidos. Ouçam a melodia das vozes, o canto dos pássaros, os sons poderosos de uma orquestra, como se fossem ficar surdos. Apalpem os objetos, como se o sentido do tato lhes fosse faltar. Respirem o perfume das flores e apreciem o sabor dos alimentos, como se amanhã fossem perder para sempre o paladar e o olfato." (Helen Keller)

Cristina sei que segue a comunicação social local. O que acha deste semanário?
Leio todas as notícias “online” e considero-as enriquecedoras… O JNE dá-me a possibilidade de aceder a assuntos diversificados, e isso é gratificante para mim.

NOTA FINAL
Esta nota final vai ser das mais curtas de sempre, por duas razões. A primeira é porque o que aqui importa é mesmo dar espaço à minha amiga Cristina Leites e a segundo porque apenas quero dizer que conheço a Cristina há muitos anos, já falei com ela inúmeras vezes, recordo uma ida ao Museu de Fão, em novembro de 2010, onde visitamos uma exposição para invisuais e de venda nos olhos, de mão dada com a Cristina, lá fiz essa emocionante visita. A Cristina é uma pessoa com uma formação e uma cultura geral invulgares e tem uma voz que nos enche os ouvidos. Parabéns, Cristina, por ser uma mulher tão corajosa e persistente e por viver a vida com tanta intensidade. Um magnífico exemplo de superação e de querer, numa sociedade, por vezes, tão injusta e cruel, onde contam mais os números do que as pessoas. Apenas é publicada uma parte da entrevista, mas em breve será publicada completa. Um abraço, forte, deste amigo e obrigado pela conversa tão agradável e surpreendente que tivemos. Vai surpreender e muito, todas os leitores.
16-07-2016,

Mário Fernandes